Ensaio sobre a vida e obra de Du Bocage

 

Marcio Vieira de Carvalho[1]

Manuel Maria de Barbosa du Bocage (Setúbal, 15 de Setembro de 1765 — Lisboa, 21 de Dezembro de 1805) poeta português, suas duas facetas, lírica e satírica. Nos seus sonetos satíricos Bocage primeiramente chafurda na sua vida boemia com poemas eróticos, burlescos e satíricos. Já du Bocage lírico exprime suas obras em duas vertentes, a primeira focada no Lócus Amoenus onde há ordem e harmonia focando na beleza pastoril, arcadista onde se vive o carpe diem. Na segunda há um rompimento com a primeira vertente formando o Lócus Horrendus que trás a morte, depressão e trevas como tema. Nas duas ordens líricas é possível ver traços claros do romantismo e do neoclassicismo.

O Satírico Bocage

A obra satírica de Bocage é composta de 69 sonetos que variam entre sátiras, poemas burlescos e poemas eróticos.

[SONETO AO ARCADE LERENO]

Nojenta prole da rainha Ginga,

Sabujo ladrador, cara de nico,

Loquaz saguim, burlesco Theodorico,

Osga torrada, estupido rezinga;

E não te accuso de poeta pinga;

Tens lido o mestre Ignacio, e o bom Suppico;

De ocas idéas tens o casco rico,

Mas teus versos tresandam a catinga:

Si a tua musa nos outeiros campa,

Si ao Miranda fizeste ode demente,

E o mais, que ao mundo estolido se incampa: [estólido]

É porque sendo, ó Caldas, tão somente

Um cafre, um gozo, um nescio, um parvo, um trampa,

Queres metter nariz em cu de gente.

Na sua obra satírica du Bocage ou mesmo com usando seu pseudônimo Elmano Sadino satiriza o governo, os Arcades e Padres e  como no “Soneto ao Arcade Lereno” o poema todo é recheado de insultos. É dirigido ao padre Domingos Caldas Barbosa (Lereno Selinuntino) ao tempo das contendas com os Arcades. Também escreve poesias eróticas que chocam e divertem seus leitores como o soneto “Membro monstruoso” um soneto sobre o Pênis e o “Soneto da Donzella Ansiosa” que se trata de uma virgem ansiosa pela primeira vez.

Du Bocage Lírico

A poesia lírica de Bocage é composta por duas vertentes e essas são mistos de duas fases. As vertentes são a Lócus Amoenus e a Lócus Horrendus que contém traços das suas duas fases a Pré-romântica e a neoclássica.

Lócus Amoenus

Na Lócus Amoenus Bocage simula muitas vezes um sentimento Bucólico, etéreo, luminoso que são traços do Arcadismo neoclássico e também na sua forma (soneto) e se mistura com traços românticos, o caráter autobiográfico, a reflexão de sua alma na presença da amada, explicitado no Soneto “Olha, Marília, as Flautas dos Pastores”.

[SONETO OLHA, MARÍLIA, AS FLAUTAS DOS PASTORES]

Olha, Marília, as flautas dos pastores

Que bem que soam, como estão cadentes!

Olha o Tejo a sorrir-se! Olha, não sentes

Os Zéfiros brincar por entre as flores?

Vê como ali beijando-se os Amores

Incitam nossos ósculos ardentes!

Ei-las de planta em planta as inocentes,

As vagas borboletas de mil cores.

Naquele arbusto o rouxinol suspira,

Ora nas folhas a abelhinha pára,

Ora nos ares sussurrando gira.

Que alegre campo! Que manhã tão clara!

Mas ah! Tudo o que vês, se eu não te vira,

Mais tristeza que a noite me causara.

Lócus Horrendus

O Lócus Horrendus segunda vertente de Bucage é uma quebra com os traços bucólicos do arcadismo trazendo a tona as trevas do autor, suas mazelas e tem como  tema a morte, a morte como forma de escapar do sofrimento, morte que serve de cura, alivio e que abraça a todos, como no soneto “Já Bocage não sou!… À cova escura”. Que Bocage já com uma postura diferente se arrepende do que foi e se lamenta aconselhando até que rasguem os seus sonetos / Se me creste, gente ímpia, Rasga meus versos, crê na eternidade!/ claramente arrependido ele desencoraja a seguirem a figura que ele criou com seus sonetos eróticos e sua vida de grande mulherengo e beberão que lhe dão lhe transformaram no mito Bocage.

[SONETO JÁ BOCAGE NÃO SOU!… À COVA ESCURA]

Já Bocage não sou!… À cova escura

Meu estro vai parar desfeito em vento…

Eu aos Céus ultrajei! O meu tormento

Leve me torne sempre a terra dura.

Conheço agora já quão vã figura

Em prosa e verso fez meu louco intento;

Musa!… Tivera algum merecimento

Se um raio de razão seguisse pura!

Eu me arrependo; a língua quase fria

Brade em alto pregão à mocidade,

Que atrás do som fantástico corria.

Outro Aretino fui… A santidade

Manchei – … Oh! Se me creste, gente ímpia,

Rasga meus versos, crê na eternidade!

Conclusão

Bocage foi um dos grandes nomes do arcadismo português e também um grande pré-romântico que viveu num período de transformação cultural e ideológico, deixando isso evidente nos seus sonetos e na sua troca constante de vertente, da satírica para a lírica e do Amoenus para o Horrendus, vivendo intensamente ao menos uma grande característica do Arcadismo, o Carpe Diem. Se tornou um mito português por conta dos seus poemas de ordem satírica, escreveu sobre seus amores em forma lírica mesmo seu Lócus Amoenus sendo genérico e rompeu essa estética com belos sonetos Lócus Horrendus mostrando seu lado mais tenebroso e escuro.

Referências

http://llfeioleituras.blogspot.com.br/2012/05/arcadismo-em-poemas-liricos-de-bocage.html, acessado em 20/01/2015.

http://educacao.globo.com/literatura/assunto/movimentos-literarios/arcadismo.html, acessado em 20/01/2015.

http://www.elsonfroes.com.br/bocage.htm, acessado em 20/01/2015.

http://www.luso-livros.net/Livro/poesias-eroticas-burlescas-e-satiricas/, acessado em 20/01/2015.

[1] Acadêmico de Letras Português-Francês pela Universidade Federal do Piauí

E-mail: matadordejedis@gmail.com

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